Bolsonaro deixa herança de ódio, obscurantismo e terrorismo

A escalada de violência e intolerância bolsonarista no país passou de todos os limites. A herança maldita de Jair Bolsonaro tornou-se uma ameaça perigosa para a democracia brasileira, após anos de estímulo ao ódio praticado pelo extremista. O caso da tentativa de intimidação e constrangimento do cantor e compositor Gilberto Gil no Catar, na última sexta-feira (25), soma-se a diversas manifestações obscurantistas, atos de contornos terroristas e crimes de ódio que varreram o país nas últimas semanas desde o resultado da eleição presidencial. O mais grave deles foi o ataque a escolas de Aracruz (ES) que deixou um inaceitável saldo de quatro mortos e 12 feridos.

O assassino é filho de um PM e usou as armas do pai para cometer os crimes. “Jamais verei do que ela seria capaz. Ela estava se tornando uma mulher poderosa, alma livre, feminina. A promessa de uma vida inteira foi desfeita. Todo um futuro interrompido. A custo do ódio, do desamor, do terror”, escreveu a mãe de uma vítima de 12 anos, em uma comovente carta escrita do computador da filha. “Não venho aqui clamar por retaliação, pois de ódio, estou farta”, pediu. “Escrevo, pois não tenho mais voz para falar, não tenho mais lágrimas para chorar”.

Atos golpistas por todo o país

Com a anuência de Bolsonaro, as manifestações de fanatismo e vandalismo se alastraram como fogo. Em um intervalo de dias, o país assistiu a ameaça de um homem armado ao vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, ataques com tiros em um ônibus escolar em frente a um quartel que concentrava atos golpistas no Paraná, o incêndio de ônibus, tiros em caminhões da empresa do ex-ministro da Agricultura Blairo Maggi no Pará, o ataque a uma equipe de jornalistas do UOL em frente da Academia Militar das Agulhas Negras em Resende (RJ), tiros disparados contra a fachada de um bar considerado “de esquerda” em Brasília e, o mais grave: a convocação, por parte de um bolsonarista, de atiradores para impedir a diplomação do presidente eleito Lula no próximo dia 19 de dezembro.

“Gostaria de pedir ao agronegócio, aos empresários, que deem férias aos caminhoneiros e mandem os caminhoneiros para Brasília. São só 15 dias, não vai fazer diferença. Também pedir aos CACs, atiradores que têm armas legais… Somos 900 mil atiradores no Brasil hoje, venham aqui mostrar presença”, disse o homem, em vídeo filmado em frente ao quartel-general do Exército em Brasília.

Nos últimos meses, não apenas Lula, mas diversas lideranças do PT e de outros partidos do campo progressista – e mesmo de centro, caso do deputado federal Rodrigo Maia, hostilizado em Salvador – têm sido alvo de ameaças por bolsonaristas durante a campanha e após a divulgação do resultado das urnas. A gravidade dos ataques, no entanto, se intensificou.

A própria Gleisi foi agredida em um restaurante de Brasília, ao lado do deputado federal eleito Lindbergh Farias, logo após a vitória de Lula. Do mesmo modo, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) também entraram na mira do inconformismo injustificável e antidemocrático que marcam os atos golpistas dentro e fora do país.

O uso de CACs para armar a população

Tanto a convocação criminosa do bolsonarista em Brasília quanto a chacina em Aracruz são resultado direto da estratégia do atual presidente de armar a população a todo custo, como ele mesmo confessou na famigerada reunião ministerial de abril de 2020, vazada depois para a imprensa.

Para concretizar seu plano macabro, Bolsonaro flexibilizou o acesso a armas de fogo por meio do grupo de colecionadores, atiradores e caçadores, os CACs. Desde 2019, o governo federal editou mais de 40 atos normativos e decretos para afrouxar o controle de armamentos no Brasil. O resultado é uma tragédia sem precedentes: hoje há mais civis com registro de armas do que policiais militares e membros do Exército.

6,3 mil assassinatos por conta da flexibilização 

De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), mais de 6,3 mil assassinatos poderiam ter sido evitados no país, caso a flexibilização ao acesso aos armamentos não tivesse ocorrido. O registro de CAC hoje cobre 700 mil pessoas, que possuem o direito de comprar até 60 armas (30 delas de uso restrito) e 180 mil balas anualmente.

“Temos uma lei vigente, o Estatuto do Desarmamento, que foi objeto de um desmonte, por atos abaixo da lei, na forma de decretos e portarias”, apontou o senador eleito Flávio Dino (PCdoB-MA), integrante da equipe de transição.

“Forças de segurança? OK. Pessoas em locais ermos, pessoas que, objetivamente, tenham alguma dificuldade de o Estado prover segurança… Agora, CACs que estão se prestando à multiplicação de milícias privadas, desvios de armas de fogo, inclusive para quadrilhas, fraudes nos sistemas informatizados de controle, como nós vimos em vários Estados, é nisso que vamos mexer”, prometeu Dino, entrevista à Band, neste domingo . “O liberou geral deu errado”, confirmou o senador, ao G1.

Gil: “Agressão estúpida”

Após o ataque no Catar, Gilberto Gil gravou um vídeo para agradecer a enorme onda de solidariedade que tomou conta das redes no fim de semana, com políticos e artistas condenando as agressões sofridas por ele e a empresária Flora Gil. “Nossos agradecimentos, meu e da Flora, enfim por essa solidariedade diante dessa agressão, dessa coisa estúpida”, disse.

Ainda no dia do ataque, Lula e a futura primeira-dama Janja telefonaram ao casal. Pelo Twitter, Lula afirmou que Gil “é um dos maiores brasileiros da história”, enquanto Janja apontou que o cantor “é patrimônio da música brasileira e merece todo nosso respeito e reverência”.

Inconformado, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) revelou que irá apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) e cinco projetos para punir a intolerância e crimes contra o Estado Democrático de Direito.

O ovo da serpente

O extremismo desenfreado do bolsonarismo é resultado de anos do péssimo exemplo de Bolsonaro antes mesmo de entrar para a vida pública. O radical de direita já foi preso quando era capitão do Exército por indisciplina e atos terroristas.

Em 1987, a imprensa revelou que o então capitão planejara explodir bombas em quartéis e outras unidades militares no Rio de Janeiro. A revista Veja chegou a apresentar um esboço do plano feito à mão por Bolsonaro.

Como deputado federal, Bolsonaro deu inúmeras demonstrações de intolerância, homofobia, racismo, misoginia, afronta aos direitos humanos e preconceito contra os mais pobres. Anos depois, já na campanha de 2018, radicalizou o discurso, prometendo “fuzilar a petralhada” e popularizando o gesto das “arminhas”.

Após anos chocando o ovo da serpente do fascismo, a derrota inquestionável de Bolsonaro nas urnas foi a senha para o extremista insuflar de vez seu exército de golpistas e fanáticos. Ao atentar contra a democracia com bloqueios nas estradas e atos em quartéis, os grupos, muitos financiados por empresários inescrupulosos, ameaçam a ordem institucional, a segurança dos brasileiros e até mesmo o funcionamento da economia. É hora de dar um basta na cultura do ódio e superar de vez a herança maldita de Bolsonaro. A sociedade civil e o novo governo precisam de paz para trabalhar.

Da Redação, com informações de G1, Band e UOL

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